terça-feira, 27 de outubro de 2009

O enxofre do diabo




Por Sandro Neiva



Há dez anos o Brasil era o maior produtor mundial de açúcar e mais da metade da produção era destinada ao mercado exterior. Hoje, nem a Europa nem os Estados Unidos querem saber do açúcar brasileiro. O motivo? quantidades excessivas de enxofre, consideradas não compatíveis com a saúde dos consumidores europeus e norteamericanos.


Algumas indústrias já começaram a abandonar a utilização de enxofre no processo de branqueamento do açúcar, substituindo-o pelo ozônio. Além da garantia de um produto mais saudável - tanto para consumidores quanto para as pessoas envolvidas na fabricação -, o açúcar ozonizado alcança um maior valor de mercado.


É intrigante o descaso governamental a respeito do enxofre – elemento químico venenoso indicado pela letra S e pelo número atômico 16. Na antiguidade, os chineses utilizavam o enxofre na produção da pólvora. Mais tarde foi condensado na cabeça dos palitos de fósforo, usado no processo de clareamento do açúcar e até na fabricação de baterias.


Assim como os mineradores e as lideranças governamentais têm conhecimento do poder letal do arsênio na poeira nossa de cada dia, os usineiros e as tais lideranças governamentais também sabem do poder letal do enxofre no cafezinho nosso de cada dia. É muito provável que saibam também que altas concentrações desse produto vulcânico em reação com a água dos pulmões provocam a formação de ácido sulfúrico, causando hemorragias que podem mandar o sujeito para o inferno. A propósito, seria esta a origem da crendice folclórico-popular de que o inferno e o diabo federiam a enxofre?


Basta fazermos um exercício de coerência dedutiva e não é difícil imaginar o perigo que deve estar embutido nos molhos, enlatados e demais porcarias à venda em qualquer esquina. Pelo menos, a partir de agora, sabemos que além do excesso de açúcar que as garçonetes energúmenas costumam colocar nos nossos sucos e cafés, há também um excesso criminoso de enxofre. E o pior, com a conivência de órgãos estatais como a Anvisa - Agência Nacional de Vigilância Sanitária.


sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Nós contra nós mesmos












Por Sandro Neiva

Sobrevivemos em um conjunto de imagens com as quais somos empurrados a identificar-nos. Atuamos cada vez menos por nós mesmos e cada vez mais em função de abstrações que nos dirigem segundo as leis do comércio e do mercado. Nós contra nós mesmos, cordeiros domesticados prontos para sermos etiquetados. Seres ruminantes, que renunciam ao prazer de viver realmente de acordo com as próprias convicções. Neste cenário desolador, cada um representa aquilo que não vive e cada um vive falsamente aquilo que não é. É por isso que nos dias atuais - o papel e a função de cada indivíduo em promover o desenvolvimento da sociedade como um todo – não passa de uma enorme mentira deslavada, de um cinismo sem fim.



quinta-feira, 22 de outubro de 2009

A imbecilização generalizada do horário nobre




Por Sandro Neiva

A televisão é o veículo da imbecilização generalizada e da mentira oficializada. Ela não somente nos afasta dos problemas reais da vida como também empurra todas as pessoas a identificarem-se com o vil, o mesquinho e o irreal.

Entorpecidos pelo tal horário nobre, colocamo-nos abstratamente no lugar de um chefe de Estado, uma estrela pop ou uma vítima de estupro. Enfim, reagimos como se não fôssemos nós, mas outra pessoa.

As imagens dos telejornais, novelas e comerciais que nos dominam, representam, acima de qualquer coisa, o triunfo daquilo que nós NÃO somos. É a vitória daquilo que sufoca nossos anseios e nos distancia de nós mesmos.


quarta-feira, 21 de outubro de 2009

O espetáculo da estupidificação coletiva









Por Sandro Neiva

A educação das massas no Brasil é ministrada por uma dúzia de apresentadores e apresentadoras de televisão. Não é difícil perceber uma linguagem subterrânea na boca e nos trejeitos dessas hienas maquiadas, a serviço da moral vigente e do status quo.

Enquanto segue em cartaz o espetáculo da estupidificação coletiva, o efeito colateral mostra-se devastador e torna-se visível nos preconceitos, gestos condicionados e hábitos de consumo pequeno-burgueses, que permeiam nossa vida cotidiana.

Explicitamos nossa estupidez no trabalho, no trânsito e em todas as situações nas quais exercemos uma atividade que não foi posta a serviço de nosso bel prazer de nossa soberania pessoal.




terça-feira, 20 de outubro de 2009

MARCELO D2, queimando tudo até a última ponta!




Por Sandro Neiva

Marcelo Maldonado Gomes Peixoto, ou simplesmente Marcelo D2, é hoje considerado um dos maiores nomes da música nacional. Absolutamente integrado às frescuragens típicas do mainstream, o artista vai ao Faustão, ao Gugu, faz turnê internacional e seu rap-samba-rock é tilha sonora de novela global. Mas a vida nem sempre foi uma deliciosa larica. Em 1997, quando ainda era líder da extinta e polêmica banda Planet Hemp, D2 foi preso após um show em Brasília e puxou oito dias de xilindró, acusado de apologia da maconha. O artista me concedeu essa entrevista descontraída, no saguão de um hotel da Capital Federal. A conversa gira em torno de baseados, Cannabis Cup, Amsterdã e... ah, sim! já ia me esquecendo… ele falou também sobre música (risos), MST, eleições para presidente e otras cositas más. Confira.

Qual sua opinião sobre a qualidade da maconha brasileira?
MARCELO D2 – Aqui não tem a boa mesmo. Em toda a Europa, e principalmente na Califórnia, o fumo é bem tratado, faz menos mal para o pulmão. No Brasil, as pessoas fumam amônia que os traficantes colocam para disfarçar da polícia, fumam um monte de merda. A não ser em Pernambuco, que tem aquele bagulho soltinho, mas que é bem fraquinho.

Fale sobre a experiência de participar de uma Cannabis Cup (torneio anual realizado em Amsterdã, que elege o melhor beck do mundo) na Holanda.
MARCELO D2 – A Cannabis Cup é uma parada muito séria. Existe uma indústria de cannabis no mundo inteiro. O Fernando Gabeira até tentou trazer sementes, que depois foram apreendidas. Um absurdo. O Planet Hemp tocou no torneio de 1997. Durante o dia rolam encontros de fabricantes de sabão em pó, de roupas, de papel, tudo feito de cânhamo. Acontecem também debates, em que as pessoas contam suas experiências, contam como é a repressão policial em seus países. E à noite rolam as festas, shows, a bagunça mesmo. Gente do mundo todo se reúne para a degustação. Fomos a convite da revista Trip, para olhar como era. Várias paradas acontecendo ao mesmo tempo, em toda a cidade. Foi muito maneiro.

Você acredita que a opinião pública no Brasil está mostrando uma maior aceitação em relação ao tema “maconha”?
MARCELO D2 – Com certeza. De uns anos pra cá, mudou pra caramba. Antigamente, se você fosse falar de maconha, tinha que falar bem baixinho, não era uma palavra normal. Hoje em dia as pessoas estão mais abertas, mas por outro lado, é tudo muito de onda também. Ninguém entende porra nenhuma do assunto, ninguém tem uma opinião própria formada, ninguém pesquisa muito sobre o tema. As pesquisas mostram uma oscilação. Agora 60% estão a favor e 40% estão contra, depois o contrário, saca? O debate sobre a legalização tem evoluído muito. O que ocorre é que somos um país de Terceiro Mundo. Aqui no Brasil o governo nunca vai tomar a decisão de legalizar a maconha. Não temos nenhum governante que tenha peito para tomar uma decisão dessas. A opinião pública é forjada e esses caras só tomariam uma decisão assim depois que a França, Inglaterra ou Estados Unidos tomassem.

Por falar nisso, você tem candidato a presidente para as próximas eleições?
MARCELO D2 – Não. Eu não voto há muito tempo. Eu só votarei no dia em que pintar um candidato forte de verdade. Por enquanto está ruim, só tem bundão.

Houve um show em que você apareceu enrolado a uma bandeira do Movimento dos Trabalhadores-Sem-Terra. O que você acha da atitude do MST, ao invadir prédios públicos e fazendas?
MARCELO D2 – É errado invadir e destruir. Mas é um movimento pacífico e sério pra caramba. Poucos países do mundo têm movimentos sérios como o MST. Eu visto a camisa literalmente porque é o povo lutando por sua fatia no bolo.

Você declarou na revista Playboy que já roubou muito toca-fitas. Você não teme que isso possa influenciar negativamente os fãs adolescentes?
MARCELO D2 – Eu estava falando sobre minha vida. Cada um deve saber o que faz da sua. Se o cara começar a fumar maconha só porque o D2 fuma, se o cara começar a dar o cu porque o Clodovil dá, o cara é um bosta. É gente assim que entra em cinema dando tiro em todo mundo, que toca fogo em índio. Eu decidi quais caminhos eu devo seguir, mas eu não posso me responsabilizar pela atitude de outras pessoas. Não estou aqui para ser um mensageiro da verdade, só estou fazendo um som e falando o que penso.

Você também afirmou na Playboy que jamais fumou crack…
MARCELO D2 – É mentira… fumei sim (risos).

E heroína?
MARCELO D2 – Já cheirei. Não tomei "nos canos" porque tenho medo de agulha. Usei em São Paulo e Amsterdã. Em são Paulo foi com aqueles beatniks velhos e loucos. Foi uma heroína branca, asiática.

Quando o Planet Hemp ficou preso por oito dias em Brasília, rolou algum baseadinho ou vocês ficaram só na fissura?
MARCELO D2 – Ficamos os oito dias na fissura mesmo, cara. Não deu pra rolar nada, a gente tava muito tenso. O único pensamento era sair dali o mais rápido possível. Aliás, eu senti mais falta da cerveja que do baseado.

Chega de drogas, vamos falar de música… cite cinco discos que considera fundamentais. E o que tem escutado?
MARCELO D2 – O primeiro do Wu Tang Clan, o primeiro do De La Soul, o Paul’s Boutique e o Raising Hell, dos Beastie Boys e Booggiedown Productions. Esses cinco discos não podem faltar numa coleção que se preze. Eu escuto muita coisa antiga: jazz, funk, reggae, samba, bossa nova. Mas o que mais ouço é hip hop mesmo.

Como você avalia o rap e o hip hop brasileiros?
MARCELO D2 – Eu acho que o rap nacional tem que tomar identidade. Os Racionais MC’s são muito bons, mas todas as bandas estão copiando. O Mano Brow mesmo fala isso. Você vai a Fortaleza ou a Maceió e os caras dizem: “cerrto mano. É nois na fita, tá ligado?" (imita com sotaque de paulista). Outra coisa que falta no hip hop brasileiro é passar um pouco de cultura para o povo. Pra mim, o hip hop é pegar ônibus, pichar muro e ir trabalhar. O rap é a trilha sonora, o break é a dança, o grafite é a arte. Assim como o samba antigo, o hip hop tenta elevar o moral das pessoas. Quando um moleque de 16, 17 anos não sabe que caminho deve tomar, é nessa hora que a música rap entra com a mensagem de “levante a cabeça e siga em frente que você vencerá. Mas isso não significa dar conselhos, que tá por fora. Expor uma opinião própria, tudo bem. A mensagem é: “vamos tocar o terror, pois a gente é mais forte que eles”.


Qual sua opinião sobre a distribuição de músicas em Mp3, via internet?
MARCELO D2 – É muita hipocrisia um multimilionário de uma gravadora reclamar dessa questão. Burlou um pouco a lei, eu já acho maneiro. É uma forma diferente e democrática do som chegar ao ouvido das pessoas. A gravadora é que tem que se preocupar com essa porra, eu não quero nem saber.


segunda-feira, 19 de outubro de 2009

A paz do inventor da dinamite


Por Sandro Neiva

O Prêmio Nobel da Paz foi conquistado no último dia 9 de outubro pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. O próprio presidente se disse surpreso e admitiu não ter um histórico que prove sua luta pela paz.

Mas deixemos Obama pra depois e vamos fazer algumas considerações acerca do grande protagonista da festa. Poucas pessoas sabem quem realmente foi Nobel. Nascido na Suécia em 1883, Alfred Nobel foi um químico milionário, inventor da dinamite. Durante experimentos com nitroglicerina, houve uma explosão acidental e o corpo de seu irmão Emil se espatifou pelos ares. Todavia, como sabemos, o invento foi um sucesso e disseminou-se rapidamente mundo afora.

Provavelmente por sentimento de culpa ou vaidade exacerbada, Nobel deixou instalada em sua terra natal, uma usina de hipocrisia e presunção: a Fundação que leva seu nome - e que premia anualmente, com seus milhões de libras, euros, dólares e coroas, investidos na Bolsa de Valores de Estocolmo, - os bonachões mundiais da física, química, literatura etc.

Dizem as más línguas que o “Mercador da Morte” – como Nobel era chamado pela imprensa da época - não incluiu o prêmio para as ciências matemáticas porque sua esposa havia lhe colocado um par de chifres com um matemático.

Que o presidente da nação que mais produz guerras na história moderna tenha faturado 1 milhão de euros com o prêmio Nobel da Paz é uma piada mórbida e uma agressão. E daí, que venha a doar o dinheiro a instituições de caridade?

Atitude de verdade quem demonstrou foi o filósofo francês Jean Paul Sartre, que, ao ser agraciado com o prêmio Nobel de Literatura, em 1964, recusou-o prontamente. Segundo Sartre, "nenhum intelectual pode ser transformado em instituição".

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Pequenas igrejas, Grandes negócios




Por Sandro Neiva

Consultava, por acaso, a lista telefônica de Brasília e com espanto percebi, naquelas letrinhas miúdas, que as páginas 199 até a 201, são reservadas, exclusivamente, a nomes e telefones de igrejas. Por quase todos os cantos da Capital Federal, existe uma seita, um centro, uma congregação ou uma paróquia qualquer.

Da caatinga para o cerrado, foram muitos os retirantes iluminados, que assim como Antônio Conselheiro em Canudos, construiram barracões precários e passaram a cobrar ingressos para a entrada do Reino Dos Céus.

O negócio cresceu, os retirantes passaram a vir de todos os cantos do país e do mundo, os barracões transformaram-se em templos luxuosos e os investidores ficaram ricos. Hoje, cada uma dessas empresas, que proliferam a cada dia, ostentam nomes mais lunáticos e inusitados que os outros concorrentes.

Separei aqui alguns dos nomes mais significativos:

Mitra arquidiocesana; Movimento Eureka; Oratório Soldado; Padres Estigmatinos; Nossa Senhora Consolata; Sukyo Mahikari; Pronto Socorro Espiritual; Igreja Maanaim; Menino Jesus de Praga; Centro Espírita Cantinho da Fé; Santos dos Últimos Dias; Comunidade Evangélica Boa Semente; Nossa Senhora das Dores; Nova Canaã; Maranata; Sociedade Maçônica Filhos de Salomão; Sindicato dos teólogos confederativos; Congregação dos Religiosos Terciários; Vale da Benção; Manancial de vida; Evangelho Quadrangular; Vale do Amanhecer; Exército de Salvação; Igreja Santo Cura D’ars; Igreja da Vinha; Perfect Liberty; Lectorium Rosicrucianum; Lumen Dei; Ministério Cristão da Restauração; Shalon; Amor sem fronteiras; Sarca Ardente; Assembléia dos primogênitos; Nossa Senhora da Medalha Milagrosa; Apocalipse Pentecostal; Sara nossa terra; Centro Budista Tibetano; Bom Jesus dos migrantes; Maná Novo; Mil vezes Imaculada…

Não estaria na hora de uma intervenção federal a essa lucrativa indústria da histeria e da alienação?


quinta-feira, 15 de outubro de 2009

A imunda fraternidade dos crocodilos sorridentes




Por Sandro Neiva

Brasília segue sua trajetória de cidade esquizóide. Um apartamento de merda no Plano Piloto continua custando em torno de trezentos mil euros; os funcionários públicos continuam se digladiando por uma mesa com internet e impressora.



Os jovens da classe média continuam se adestrando para entrar no TCU ou na Procuradoria da República, dando continuidade também às grandes mamatas e aos salários fabulosos de seus familiares e padrinhos.



Os homens públicos - que passam apenas três ou quatro dias da semana na cidade - continuam inflacionando não apenas o mercado da prostituição e dos táxis, mas também o mercado do casamento e do transporte coletivo.



E assim segue a vida no planalto central. Como diz a letra da velha canção punk: “na imunda fraternidade dos crocodilos sorridentes”.


quarta-feira, 14 de outubro de 2009

KID VINYL, o senhor do showbizz





Por Sandro Neiva

Cantor, crítico musical, radialista, VJ da MTV, diretor artístico internacional da gravadora Trama – o cara já fez de tudo no mundo da música. Em 1979, foi um dos principais divulgadores do movimento punk no país, quando era locutor da extinta rádio Excelsior FM. Ná década de 1980, fez sucesso em todo o Brasil com os hits “Eu Sou Boy” e “Tic Nervoso”, de sua banda Magazine. Hoje, Aos 53 anos, KID VINYL é uma lenda do showbizz brasileiro, espécie de enciclopédia musical, especialista nas artimanhas do meio. Ele me concedeu esta entrevista em São Paulo, na sede da gravadora Trama – uma das poucas que consegue sobreviver ao MP3/discos piratas e cujo dono é João Marcelo Bôscoli, filho de Elis Regina.


Que tipo de música não entraria na Trama?

KID VINYL – Desde o início a gente decidiu que grupos de pagodeiros tipo Fundo de Quintal e uma série de outros que vieram bater à nossa porta não entraria na Trama. Com o devido respeito aos caras, mas não entram na nossa gravadora. Por quê? Porque é modismo. Então, não é legal, não nos interessa, pois tudo que vira modismo dentro da música brasileira – como pagode e axé – a gente não lança. Se não tem a ver com nossa filosofia, não lançamos de jeito nenhum. Não precisamos nos vender dessa maneira e entrar nesse mercado sujo, eu diria, dessa coisa exclusivamente comercial que as grandes gravadoras ditam.

A Trama também atua no mercado estrangeiro, não é?
KID VINYL – Sim. Nós temos levado a música brasileira ao exterior e a recepção tem sido excelente. Nossos lançamentos estão sendo muito bem aceitos lá fora. Às vezes, até melhor do que aqui, eu diria. O Max de Castro, por exemplo, que é um artista do nosso cast, recentemente foi matéria de capa da revista Time.


O que há de lenda e realidade a respeito do jabá, aquele famoso dinheirinho que as gravadoras distribuem às rádios para que elas veiculem determinados artistas?
KID VINYL – Na verdade, a prática do jabá é absolutamente comum e é controlada pelas rádios em geral. Hoje, a rádio é um espaço comercial. Uma grande emissora oferece espaços comerciais e está sempre aberta às grandes gravadoras, que chegam e compram o pacote com tantas execuções. O preço é combinado e é emitida até mesmo uma nota fiscal, se for preciso. Quer dizer, é um dinheiro considerado como verba lícita, porque eles vendem como espaço comercial. Ninguém pode processar os caras porque acima de tudo, o rádio é um veículo de comércio, então, eles estão sempre juridicamente amparados. Cada minuto é vendável, e ele pode ser preenchido com música, com comercial ou qualquer outra coisa. Não há como criticar muito o jabá, pois é uma maneira que as gravadoras têm de anunciar sua música, que também acaba sendo um produto como qualquer outro. Digamos que não é a maneira correta, mas infelizmente a coisa funciona dessa maneira.


Na sua opinião, qual o caminho que a música brasileira irá trilhar nos próximos 10 anos?
KID VINYL – A fusão de música brasileira com elementos de música eletrônica, apesar de ser incipiente e estar apenas engatinhando é muito saudável, é um parâmetro para o que deve vir por aí nos próximos anos. Eu acredito também muito na geração que veio após o Chico César: O Zeca Baleiro, o Lenine, mas estes são nomes que já se consolidaram. A Trama está lançando uma geração na qual eu acredito bastante, mas é lógico que existem outros nomes interessantes, muita gente que nem foi descoberta pelas gravadoras, mas com propostas muito boas.


Quais os lançamentos internacionais da Trama na linha de rock?
KID VINYL – Lançamos MC5, Bad Brains, New York Dolls, Johnny Thunders, e vamos soltar ainda outras bandas fundamentais para quem entende e gosta de rock alternativo. Todo esse material vem do catálogo do selo Americano Rior, que é especializado em resgate de sons raros, gravações ao vivo, obscuras. Damos uma peneirada no catálogo para ver o que vale a pena e lançamos alguns nomes.


Em tempos de troca de arquivos gratuitos de mp3 via internet, qual a vendagem mínima que um artista deve alcançar para que um lançamento dê retorno comercial?
KID VINYL – Para um disco internacional, se vender mil cópias já vale a pena, já paga os gastos do lançamento. Para um disco nacional, depende muito do quanto é gasto na produção. Se for gasto, por exemplo, 50 mil reais para se fazer o disco, tem que se vender pelo menos 10 mil cópias para se atingir o chamado breaking even, que é o equilíbrio, a vendagem minima necessária para ser viável comercialmente.


Você acredita que a juventude atual está mais aberta a novos sons que no passado?
KID VINYL – Eu não sei. Eu gostaria que realmente estivesse mais aberta. É lógico que depende muito da formação musical de cada pessoa, mas às vezes penso que a molecada deveria se informar um pouco mais. Apesar de terem internet e ultra-celulares, parece haver um certo comodismo. Todos querem soar como o Green Day e o Offspring, mas poucos conhecem o trabalho dos Mutantes, entendeu? Talvez a culpa não seja só deles, pois não existe uma imprensa musical mais ativa, não há tantos veículos ativos e alternativos que transmitam memória musical, que pudesse mexer com a cabeça deles.


Faça uma breve avaliação do cenário roqueiro no Brasil.
KID VINYL – Acho a cena do rock um pouco dispersa no nosso país. Existem muitos nomes legais e eu sinto falta de essas bandas estarem mais expostas à grande mídia. Há uma carência de sons alternativos no mainstream. No fim, acaba-se ouvindo sempre a mesma coisa ou aquilo que chega das rádios, que é um produto que já chega pasteurizado e massificado. Daí a importância de festivais como o Abril Pro Rock, em Recife e o Porão do Rock, em Brasília, dentre outros. Se a cena do rock alternativo conseguisse se expor mais à mídia como a música eletrônica consegue, a coisa funcionaria melhor.



terça-feira, 13 de outubro de 2009

Vossa Excelência




Por Sandro Neiva

Sabe aquelas inúmeras vezes na vida em que dá uma vontade danada de soltar um palavrão bem cabeludo pra descarregar a raiva acumulada? Sempre que quiser dar uma pisoteada no âmago de qualquer político, ladrão, sequestrador ou outro bandido qualquer, esqueça os insultos. Não o chame de "filho disto", "filho daquilo" e muito menos o mande "tomar-não-sei-lá-onde". Não perca tempo descarregando o seu precioso repertório de impropérios, pois ele vai rir na sua cara. Seja abrangente e visceral: chame-o simplesmente de VOSSA EXCELÊNCIA!


A democracia da Hiena

Por Sandro Neiva

Ao zapear aleatoreamente o controle remoto, vi sintonizado na tela o canal da TV Senado. Os lingüistas aprenderiam muito se observassem o uso que aqui se faz da linguagem e passassem a mapear o território esquizóide que há entre a retórica e a ação.

Uma hiena calva e gorda pede a palavra. Rodeios lingüísticos e firulas proverbiais para defender o indefensável. Citações de pensadores ilustres saem como meretrizes de sua boca. Vossa Excelência pra cá, Vossa Excelência pra lá. É a isso que chamam de ética?

A discussão foi estupenda. Comparado, o samba-do-crioulo-doido seria fichinha. Mas mesmo assim, no final, as hienas miseráveis foram unânimes nos aplausos calorosos e em afirmar que é com esses monólogos neuróticos e com essa verborréia pseudo-intelectualóide que se constrói a tal democracia.


quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Muita estrela pra pouca constelação


Por Sandro Neiva


Mesmo espremido pela arquitetura excludente da ficção urbanóide engendrada por Niemayer e Lúcio Costa – viver aqui em Brasília até que tem lá suas vantagens: quase todos os dias é possível assistir a shows diferentes na Esplanada do Poder.


Hoje são os estudantes da UNE emputecidos com a fraude do ENEM. Ontem foram os monocultures que devastam o cerrado com suas ceifadeiras agrícolas. Amanhã podem ser as mulheres dos militares ou os simpatizantes do uso de células-tronco;


Na próxima semana serão os que combatem o aborto, a eutanásia e os que defendem a libertinagem dos padres. No próximo mês virão os criminosos xiitas do MST ou pode ser a vez dos que lucram com as vidas despedaçadas dos meninos de rua. Mas talvez seja apenas mais uma caravana de vereadores e prefeitos, em busca de mais leite na têta;


Depois chega a Proclamação da República e certamente o circo de quinta categoria será novamente armado e encenado. Numa quarta-feira-qualquer aparecem os funcionários de cassinos e na mesma tarde os professores ameaçam entrar em greve de fome. E então já é quinta-feira e para os parlamentares já é o fim do expediente semanal, dia de mais um vôo para seus estados de origem. Daí a corte vira uma calmaria só.


Curiosamente, na década e meia que habito este deserto, nunca vi uma passeata de banqueiros, nem de comerciantes, nem de juízes, muito menos de políticos. Aqui em Brasília também nunca tive conhecimento de protesto organizado por agiotas nem por donos de imobiliárias. Nunca ouvi falar em manifestação das pessoas que contraíram câncer por causa da ação das mineradoras transnacionais nem em protesto de jornalistas que tiveram seus diplomas jogados no lixo pelo Supremo Tribunal Federal.




terça-feira, 6 de outubro de 2009

Anvisa proíbe uso de agrotóxico amplamente usado no Brasil


Por Sandro Neiva

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recomendou o banimento de uso, em todo país, do ingrediente ativo endossulfam, agrotóxico utilizado no cultivo de café, cana-de-açúcar e soja. A indicação foi publicada por meio de Consulta Pública, em setembro de 2009 e teve por base estudos que apontam para graves danos de saúde relacionados ao uso da substância.

A iniciativa da Anvisa não deixa de representar um avanço, mas o que fazer com o metamidofós, o fosmete, o tiran, o triclorfom, a parationa metílica, o carbofurano, o forato, o paraquate, o acetato… ? Todas essas substâncias são amplamente empregadas em plantações de tomate ou batata e há décadas estão proibidas na Europa, Estados Unidos e diversos outros países. Mas continuam sendo usadas livremente nas hortas e lavouras do Brasil, apesar do potencial mortífero.

Que tal uma bela salada de tomates recheados à moda mexicana? Ou talvez uma deliciosa sobremesa de morangos da vovó? Quem sabe umas folhas de alface para a pele do bebê? Análises feitas pela própria Anvisa em 2007 mostraram que 40% do tomate, morango e alface vendidos nos supermercados brasileiros estavam com dosagens de agrotóxicos acima do limite considerado seguro.

Retrocesso, Perversidade e Incongruência

Em 2008, acatando ação movida pelo sindicato das indústrias de defensivos agrícolas (Sindag), a Justiça brasileira proibiu a Anvisa de prosseguir os estudos que verificavam a segurança de ingredientes ativos em 99 marcas de agrotóxicos usados no país. A decisão, do juiz Waldemar Claudio de Carvalho, da 13ª Vara Federal do Distrito Federal, representa um retrocesso para o país e uma perversidade para com as pessoas. O que deveria ser um caso para a Polícia Federal, transforma-se-se em batalha judicial na República da adulteração generalizada. Se a ciência descobre que determinadas substâncias são nocivas à saúde - seja de quem as consome, seja de quem trabalha diretamente com elas - é uma incongruência reavaliá-las por força de uma liminar.

Que o governo é ineficiente e relapso não há dúvidas, mas há também o lobby, a pressão e o poder econômico dos grandes monocultures e principalmente da indústria multinacional de agrotóxicos, com sua maldita cadeia de distribuição de herbicidas, fungicidas, pesticidas, formicidas e todas essas “cidas” que alimentam o agronegócio, adoecem a plebe, agridem o planeta e se sobrepõem aos interesses coletivos.