quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

A medíocre cultura do futebol




Por Sandro Neiva

Já que estamos em ano de mais uma Copa do Mundo e em 2014 será a vez do próprio Brasil sediar o evento, aproxima-se o frisson, com levas de torcedores em surto e com o planeta inteiro estressado diante da TV. Por isso resolvi colocar em pauta algumas reflexões acerca do fanatismo e da alienação relacionados ao esportes em geral e ao futebol em particular.

Em nome de um pretenso “ideal esportivo”, os adeptos do culto da performance procuram minimizar ou mesmo omitir as realidades concretas acerca do futebol, que eles insistem em apresentar como um universo de paz, um mundo de fraternidade, de paixões igualitárias e até de democracia e de cultura. Preferem fechar os olhos para a mentira, para a má-fé, para a corrupção, para os interesses mafiosos, para as explosões de violência e para o racismo que gangrenam o espetáculo das grandes multidões.

Os ideólogos da mistificação esportiva e do “futebol-arte” nem ao menos se preocupam em repudiar os ganhos irracionais dos jogadores ignorantes e cu-sujos, pagos a preço de ouro. Esses néscios só pensam em carros de luxo e mulheres louras, enquanto os verdadeiros trabalhadores e desgraçados de todo o planeta vegetam no fundo do poço da indigência, da miséria, da pobreza e do desespero.

Pretender que o futebol seja uma parte legítima da cultura é não apenas negar a literatura e a arte, mas ter uma visão medíocre de cultura.

Tudo bem! Assumo que também tenho meu time favorito – o Atlético Mineiro – e já houve vezes em que voltei do Mineirão atordoado e eufórico, como se tivesse acabado de sair duma briga, tamanha a força da Galoucura em Minas Gerais e das torcidas organizadas (para a baderna) em geral. Mas o certo é que a selvageria que vez por outra ocorre nos estádios é apenas um reflexo da violência social, aquela que leva centenas de milhares de torcedores a aclamar da arena os gladiadores no ringue do gramado. Apenas um gosto de sangue, de ódio e de xenofobia.

Por todos os lugares, políticos encontram terreno fértil e solo adubado para se perpetuarem no poder, fazendo uma cínica apologia dos benefícios físicos e da “moral” do esporte. Sem falar que o futebol brasileiro se transformou num ambiente completamente prostituído. Uma dúzia de pessoas à frente das federações estaduais e da CBF sugam toda a riqueza do teatro da bola.

Longe de ser algo neutro, o futebol representa uma espécie de doutrinamento geral que ameaça até as cabeças mais pensantes de permanecerem lúcidas. A veemência com a qual os intelectuais se negam a criticar o futebol – deleitando-se com as vitórias de seus clubes de coração – é uma coisa perigosa, pois a junção de retórica populista com a embriaguez popular pode gerar consequências desastrosas. Os ditadores sabem muito bem que quem apóia os esportes tem as massas a seu lado. É por isso que no mundo moderno todos os governos são a favor dos esportes e contra a cultura.

Acima de tudo, urge um chamado de alerta e de reflexão sobre a velocidade com que a máquina esportiva, sob os mais variados disfarces, interfere nos aspectos mais importantes da sociedade atual, sempre agindo em favor do sistema vigente.





3 comentários:

  1. Tempo bom "foi" a época em que se jogava por amor ao time e ao futebol propriamente dito, e não por grana. Tempo de Pelé, Didi, Garrincha e companhia, até Zico... Onde não se ganhava nada. Que saudade do verdadeiro futebol arte. Pena que eu não nasci nessa época.

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  2. "QUE TEMPO BOM, QUE NÃO VOLTA NUNCA MAIS..." Thaíde

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  3. A questão é bem complexa mesmo, mas penso que o que acontece nos estádios é a reprodução do que ocorre em nossa sociedade. Jovens excluídos e sem educação encontram nas torcidas organizadas (urgh...)seus iguais e criam uma identidade em torno da violência que existe no meio em que vivem.E em um país onde o mau exemplo vigora, o futebol se torna um anestésico social poderoso, mesmo com suas contra indicações.
    O tempo bom é o Agora, pois podemos tentar modificá-lo.
    Abraço a todos.

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